
Acontecem duas tramas independentes no filme ligadas por um participante secundário, um rabino paciente do protagonista de uma história e cunhado do protagonista da outra. No final do filme, todos os principais personagens se juntam na festa de casamento da filha do rabino.
A história do oftalmologista Judah é tensa. Ele quer terminar o caso com a amante, que, definitivamente, não aceita ser dispensada. Para impedi-lo, está disposta a ir às últimas consequências: destruir seu casamento, respeitabilidade e até mandá-lo para cadeia. Como? Assista o filme. Não é difícil se identificar e sofrer junto com Judah. Ele parece ser um bom sujeito, apesar de seus “pecados”. Daí ser tão aflitiva a situação sem saída em que se vê. E, mais perturbadora ainda, a solução que se apresenta.
A história do cineasta Cliff é bem mais leve. Ele é um idealista, neurótico, desconhecido e sem dinheiro que se vê obrigado a trabalhar com o cunhado Lester, um produtor de tevê bem-resolvido, rico e famoso. Eles vão disputar o amor de uma mulher.
É como se fossem dois filmes de gêneros diferentes que se intercalam, um drama e uma comédia de costumes: a história mais leve interrompendo a mais pesada sempre que o espectador precisar de alívio emocional.
As duas tramas promovem o embate entre o bem-viver e o viver-correto, no conceito dos protagonistas. Em uma o correto refere-se ao que é moralmente recomendado, em outra ao que seria ideologicamente superior. O confronto moral é travado na consciência de Judah e o ideológico é entre Cliff e Lester tendo a desejada Halley como prêmio.
QUER MAIS?
Para mim, é a melhor obra escrita e dirigida por Woody Allen, que já fez muito filme bom. O próprio diretor interpreta o cineasta Cliff.
3 indicações para o OSCAR 1990 (sem vencer nenhum): melhor diretor e melhor roteiro para Woody Allen e melhor ator coadjuvante para Martin Landau.
DIA IDEAL PARA ASSISTIR
Cabernet Sauvignon e Merlot são duas das mais afamadas uvas da vinicultura. A primeira tem sabor forte e complexo, a segunda, suave e adocicado. Alguns vinhos, chamados varietais, são feitos com um único tipo de uva, mas a maioria compõe diferentes vinhas para conseguir um sabor mais equilibrado, sendo a mistura Cabernet Sauvignon e Merlot das mais apreciadas. Assim, há dias em que seu espírito pede exclusivamente drama ou comédia, em todos os outros, Crimes e Pecados irá agradar.
POR QUE GOSTEI?
Porque é um filme filosófico feito em forma de comédia e drama: discute temas morais e ideológicos com simplicidade, humor e fortes emoções.
SERVIÇO
Para Acompanhar
O filme é ambientado em Nova York. Embora haja cenas de jantares finos o fast-food prepondera devido ao núcleo comédia do filme. Cliff vai ao cinema com a sobrinha e comem pipoca; com Halley, cheeseburger e caramelos. Ele e a sobrinha aparecem andando na rua com fatias de pizza. Ele e Halley jantam comida indiana na quentinha de alumínio, comendo com as mãos e garfo de plástico. Ou seja, para acompanhar o espírito do filme, faça pipoca, abra pacotes de batatas chips ou amendoins. Vale tudo que for rápido e prático, até mandar vir uma pizza ou comida chinesa em caixinha. Para beber, refrigerante e cerveja. Quem preferir vinho, saiba que no filme não se toma tinto, só branco.
Pausa
Para interromper o filme aproximadamente na metade você pode fazê-lo ao final da cena em que Cliff e Halley assistem Cantando na Chuva e jantam comida indiana na quentinha (0:50:10). A seguir, haverá uma transição para o núcleo drama do filme.
Mais Informações
Título original: Crimes and Misdemeanors. Produção: 1989. Classificação: 14 anos. Para ver a ficha técnica completa etc acesse o portal oficial da MGM (em inglês): http://www.mgm.com/title_title.php?title_star=CRIMESAN#
EM DESTAQUE
Mensagem
Meu sogro, um sábio que morreu aos 102 anos, costumava agradecer a Deus por lhe conceder os meios e a sorte necessários para ser virtuoso, reconhecendo, humildemente, que suas qualidades morais e determinação não bastariam para mantê-lo íntegro. Essa é a mais pungente mensagem do filme.
A cena em (0:40:16), um diálogo imaginário entre Judah e o rabino Ben, a cena (01:10:21) em que Judah visita a casa de sua infância e lembra-se de antigas discussões à mesa e o diálogo no final do filme (1:34:02) sintetizam bem o dilema desta mensagem.
Metáfora
O Rabino Ben, o personagem que melhor representa aqueles que vêm o mundo pela ótica da moral, vai perdendo a visão no decorrer do filme até ficar completamente cego.
Tradutor, traidor!
(0:02:55) Na versão dublada, Judah fala: “Eu detestei fazer aquele discurso hoje.” O tradutor não percebeu que a cena era um flashback para mostrar porque Judah estava tão nervoso na solenidade em que era homenageado. Na versão legendada, sim, aparece: “Estou apavorado com o discurso desta noite.”
Curiosidade
(0:48:48) Halley acalma o ciúme que seu próximo encontro com Lester desperta em Cliff: “Jamais serei seduzida por um homem que usa mocassins sem meias.” Aqui no Rio de Janeiro, onde moro, é careta usá-los com meias. Em Nova York, pelo visto, deve ser excessivamente informal, quase licencioso. Folheando a revista “New Yorker” reparei nos anúncios de mocassins: todos os homens usam meias.
Que situação!
(0:28:29) Bárbara, jovem viúva irmã de Cliff, conta a ele que saiu com um homem atraente que conheceu através de anúncios classificados de jornal, costume americano precursor dos encontros arranjados pela Internet. Nos encontros preliminares ele portou-se como um perfeito cavalheiro. Quando finalmente foram para cama, convenceu-a a deixar-se amarrar e... Vai dar um frio na coluna de quem estiver conjeturando procurar companhia pela Internet. Não é o que você está pensando, é mais aflitivo.
Detalhes
Na cena de abertura do filme (0:01:32) um mestre de cerimônias apresenta: “...Naturalmente (se você precisar de um médico) pode procurá-lo de dia ou de noite, fins de semana e feriados, mas também pode contar com Judah para saber qual é o melhor restaurante de Paris ou Atenas ou em que hotel ficar em Moscou. Ou a melhor gravação de uma sinfonia de Mozart.” Apesar de duas décadas de existência o filme continua incrivelmente contemporâneo, mas uma coisa envelheceu: esse homem maravilhoso fuma. Aparece fumando no consultório conversando com o paciente (0:16:18), solitário no diálogo imaginário com o rabino Ben (0:41:02) e socialmente na festa que encerra o filme (1:33:56). Na época, ainda era elegante fumar.
(0:46:46) A Champanhe que Cliff abre para tomar com Halley, a mulher que disputa com o cunhado milionário Lester, é uma Perrier-Jouët Belle Epoque. Coisa fina.
― 4 ―
Nenhum comentário:
Postar um comentário