O LABIRINTO DO FAUNO

Antes de iniciar o projeto de recomendar filmes, se me deparasse com este DVD numa vídeo-locadora, não alugaria. A capa é soturna: em meio a um cenário de monstruosidades retratadas em preto-e-branco, vê-se, em sépia, uma menina amedrontada. Na contracapa, fotos em penumbra. E, nas duas melhor iluminadas, aparece um monstro asqueroso. Vi na Internet diferentes capas deste filme e nenhuma me atraiu. Entretanto, em busca de recomendações não óbvias, tenho assistido muita porcaria na esperança de encontrar produções inesperadamente boas, ou ótimas, como esta.

A Europa toda sofreu com a Segunda Guerra Mundial, mas a dor da Espanha começou antes, começou em 1936 com um banho de sangue: a Guerra Civil vencida pelo generalíssimo Franco. Nossa história se passa na Espanha, no após guerras. Uma viúva se casa com um capitão do exército franquista. Ela tem um filho do capitão na barriga e uma menina do casamento anterior. Ele é um homem frio e violento incumbido de exterminar focos de resistência remanescentes escondidos nas florestas.

A mãe conforma-se ao marido. Um marido-provedor era o melhor que a viúva, com uma criança por criar, poderia almejar no difícil pós-guerra espanhol. A menina Ofélia, fiel ao falecido pai, rejeita o padrasto refugiando-se num mundo fantástico, em que seu pai seria um rei mitológico à procura da filha desaparecida, ela própria. Realidade e fantasia se misturam. O espectador sabe onde termina uma e começa a outra, a menina não.

Monstros povoam o mundo sobrenatural, mas a realidade cotidiana de arbítrio, medo e violência que é horrorosa. Trata-se de uma tragédia com final feliz apenas na fantasia da garota.

REFERÊNCIAS

Guillermo Del Toro dirigiu Hellboy (2004) e Hellboy II (2008): Hellboy é um garoto, fruto de experiências nazistas para invocar forças ocultas, que é levado pelos aliados para enfrentar fenômenos sobrenaturais; no segundo filme, ele combate um príncipe que resolve reunir os fragmentos de uma coroa para trazer à vida o exército dourado de máquinas assassinas. Se, como eu, você assistiu Hellboy na tevê, não se preocupe, O Labirinto do Fauno é bem diferente.

Ivana Baquero, a Ofélia, não tinha experiência prévia em cinema. Foi escolhida dentre mais de mil garotas testadas para o papel.

Sergi López, o capitão padrasto, atuou em dezenas de filmes, dentre os quais: Pintar ou Fazer Amor; Fuso Horário do Amor; Harry Chegou Para Ajudar; Uma Relação Pornográfica; etc.

QUER MAIS?

6 indicação para o OSCAR 2006, inclusive de melhor roteiro original e melhor filme estrangeiro. Ganhou três estatuetas: direção de arte, fotografia e maquiagem.

DIA IDEAL PARA ASSISTIR

Quando estiver cansado da mesmice dos filmes de maior bilheteria e disposto a assistir um filme enternecedor, porém, um tanto sombrio e violento.

POR QUE GOSTEI?

Li uma crítica elogiando a beleza e força do filme, mas ressalvando que a realidade e a fantasia não se uniriam para formar um todo. Pois minha sensação foi oposta: realidade e fantasia se harmonizam perfeitamente até o final trágico num plano e feliz no outro. É emocionante.

SERVIÇO

Para Acompanhar

O filme é bonito, mas sombrio. Recomendo servir um cava (vinho espumante espanhol) rose bem gelado para “alegrar os corações”.

Pausa

Um bom ponto para interromper a sessão aproximadamente ao meio é em (0:50:16) ao final da sequência em que Ofélia revela para Mercedes que sabe de sua ajuda à resistência. A afeição e solidariedade entre as duas se consolidam.

Mais Informações

Título original: El Laberinto Del Fauno. Produção: 2006. Classificação: 16 anos. Veja o portal da Warner Home Entertainment: http://www.melhoresdvds.com.br/pak.php?id=96

EM DESTAQUE

Falha

(0:56:48) Considerando-se a velocidade que a areia escoa na ampulheta o tempo concedido à Ofélia seria bem menor do que foi. Nos primeiros 10 segundos, pelo que avaliei, desceu 1/6 do total. Portanto, a ampulheta seria de 1 minuto. Mas a areia vai esperar mais de 4 minutos de ação para se acabar (1:01:00).

Bastidores

Tudo foi construído, tanto no mundo fantástico, quanto no real, os domínios do capitão, o labirinto, o poço com escada interna, a árvore do sapo, a locomotiva acidentada, tudo é cenário, nada existia no local.

Mensagem

Realidade e fantasia são muito distintas, mas uma tem o poder de influenciar a outra.

Realidade e fantasia traçam o destino de Ofélia.

Detalhes

(0:09:19) Veja como o capitão é importante, sua mulher e enteada são buscados de Rolls-Royce, automóveis que, como veremos (0:38:27), estão permanentemente a sua disposição.

(0:05:33) Note que o relógio do capitão tem o vidro quebrado. Depois (0:42:00), entender-se-á a razão.

(0:23:52) O Fauno da o livro mágico à menina, com a recomendação explícita de abri-lo apenas quando estiver sozinha. E se o espectador reparar, constatará que nenhum acontecimento mágico anterior ou posterior tem qualquer participação humana, excluindo-se a da própria Ofélia. Pois é justamente a solidão que a permite devanear.

(0:31:57) Antes de enfrentar sua primeira provação, Ofélia deixa o vestido e o livro mágico fora do lamaçal onde vai entrar. Cai uma tempestade. O vestido, que é real, se emporcalha; enquanto o livro, que pertence ao imaginário da menina, como veremos adiante (0:46:48), permanecerá intacto.

(0:42:00) “Bobagem. Ele nunca teve relógio”. O capitão, assim como Ofélia, acalenta uma fantasia íntima: o reconhecimento do valor militar passado de pai para filho. Por isso, ele contrariou a prudência (0:14:48) para ter seu filho próximo a si.

(0:42:40) Que banheira espetacular!

(0:53:50) Linda sequência, parece uma sequência de quadros de Caravaggio!

(1:11:17) Repare o clarão do tiro refletido no rosto do militar.

(1:39:14) A bebida vazando pelo corte é genial!

(1:43:35) O detalhe da Lua cheia anuncia o final da profecia e o desfecho do filme.

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